Ranicultura no Brasil: Desenvolvimento Histórico, Biologia e Qualidade da Água da Rã-touro Americana

A ranicultura, a criação de rãs, é uma atividade zootécnica e econômica que vem se expandindo no meio rural brasileiro e em outros países. Nas últimas décadas, houve um crescimento acelerado devido às inovações tecnológicas e ao aperfeiçoamento contínuo das instalações e técnicas de manejo adotadas por produtores e empresários...

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                   Ranicultura no Brasil: Desenvolvimento Histórico, Biologia                                 e Qualidade da Água da Rã-touro Americana:

Autores:  Grace Kelly Pereira Dos Santos, Emile Maria Alves Araujo, Marcos Jeovane Silva

Docente: Délcio César Cordeiro Rocha

Disciplina: Criação e Exploração de Animais Domésticos

Curso: Eng. Agrícola e Ambiental ICA/UFMG 

Histórico da Ranicultura no Brasil

A ranicultura, a criação de rãs, é uma atividade zootécnica e econômica que vem se expandindo no meio rural brasileiro e em outros países. Nas últimas décadas, houve um crescimento acelerado devido às inovações tecnológicas e ao aperfeiçoamento contínuo das instalações e técnicas de manejo adotadas por produtores e empresários.

No Brasil, a ranicultura iniciou-se em 1935 na Baixada Fluminense, Rio de Janeiro. Naquele ano, o técnico canadense Tom Cyrril Harrison introduziu 300 casais de rã-touro americana (Lithobates catesbeianus) no primeiro ranário brasileiro, Ranário Aurora, localizado em Itaguaí–RJ.

Ao contrário de outros países que praticam a caça ou cultivo extensivo, o Brasil buscou desenvolver a tecnologia de criação em cativeiro. Inicialmente, os avanços ocorreram por meio de esforços isolados de criadores independentes, e posteriormente com a participação efetiva de instituições de pesquisa e universidades.

As pesquisas científicas, essenciais para o avanço tecnológico da ranicultura, começaram apenas 40 anos depois, com a realização do primeiro Encontro Nacional de Ranicultura (ENAR) em 1978, em Brasília–DF. Desde então, houve aprimoramento dos sistemas de criação, substituição dos insetos na alimentação por ração, estudo da reprodução, e investigação das doenças mais comuns pelas equipes de patologistas, o que contribuiu significativamente para a saúde e produtividade dos animais.

Importância do Consumo de Carne de Rã:

O consumo de carne de rã é um hábito milenar na China, praticado há mais de quarenta séculos, e considerado saudável pelos gregos, que difundiram esse costume pela Europa.

Classificada como pescado, a carne de rã é comparável a outras carnes magras brancas, com baixo valor calórico e teor de lipídios, tornando-a indicada para dietas hipocalóricas e hipolipídicas. Além disso, a proteína contida na carne de rã possui alto valor biológico, superando o padrão estabelecido para crianças e adultos.

Atualmente, o Brasil destaca-se no cenário mundial da ranicultura, sendo o maior produtor de rãs em sistema intensivo, ficando atrás apenas de países como Taiwan e Indonésia, onde as rãs são parcialmente soltas em terrenos alagadiços, como arrozais, em alguma fase do ciclo de vida.

O principal produto da ranicultura brasileira é a carne de rã congelada, disponível no varejo como carcaça inteira congelada ou apenas as coxas congeladas. Entretanto, a aparência do animal congelado desestimula o consumo, especialmente entre as mulheres.

Para aumentar a oferta de produtos de valor agregado a partir da carne de rã, diversas alternativas têm sido exploradas, como patê de carne de rã, carne desfiada acompanhada de molhos, salsicha de rã e coxas de rã empanadas.

Biologia da Rã-touro Americana

A rã-touro americana (Lithobates catesbeianus) é um anfíbio pertencente à Ordem Anura, Família Ranidae, e destaca-se pela robustez, proliferação e precocidade.

Os anfíbios passam por uma fase larval inicial, geralmente aquática, seguida de um processo de metamorfose completa, tornando-se seres terrestres. Dependem fortemente do ambiente aquático para várias funções vitais, incluindo reprodução e eliminação de excretas.

Com um ciclo de vida significativamente mais curto em comparação ao seu habitat nativo.  Em média, a fase de girino e engorda dura cerca de sete meses no Brasil, enquanto na América do Norte pode levar até quatro anos.

Essa espécie é altamente dependente da água, sendo essencial para sua reprodução, equilíbrio hidro-eletrolítico, defesa e eliminação de excretas e peles antigas.

A rã-touro americana apresenta várias características distintivas:

Anatomia e Fisiologia: Pele úmida e glandular, dois pares de membros, membranas interdigitais nos membros posteriores, dobras dorsolaterais ao redor dos tímpanos e coloração que varia do verde-claro ao escuro.

Metabolismo: Ectotérmica (sangue-frio), com temperatura e metabolismo variando conforme o ambiente.

Reprodução e Crescimento: Carnívora e canibal após a metamorfose, com uma dieta baseada em insetos e pequenos animais. Passa por um processo de metamorfose que inclui transformações fisiológicas e anatômicas significativas, desde girinos com respiração cutânea e branquial até imagos carnívoros com respiração bucofaríngea, pulmonar e cutânea.

Espécies Nativas de Rãs no Brasil:

No Brasil, destacam-se três espécies de rãs nativas:

Rã Manteiga ou Paulistinha (Leptodactylus latrans): Distribuída amplamente na América do Sul, esta espécie é reconhecida pelo seu grande porte e coloração marrom-acinzentada com manchas escuras. É uma predadora eficiente, alimentando-se de insetos e outros pequenos invertebrados. Esta espécie foi reclassificada em 2010, passando de Leptodactylus ocellatus para Leptodactylus latrans.

Rã Pimenta (Leptodactylus labyrinthicus): Encontrada principalmente em áreas de cerrado e matas abertas, a rã pimenta possui corpo robusto e coloração variada entre marrom e verde-oliva, com manchas escuras. Sua dieta é predominantemente composta por insetos, destacando-se como uma importante controladora de populações de invertebrados.

Gia ou South American Bullfrog (Leptodactylus pentadactylus): Comum na Região Norte do Brasil, a gia é conhecida pelo seu grande porte e coloração variável, que pode ir do marrom ao verde. É uma predadora generalista, alimentando-se de uma ampla gama de presas, incluindo pequenos vertebrados. A presença dessa espécie contribui para o equilíbrio ecológico de seu habitat.

A criação comercial de espécies nativas não é autorizada no Brasil. Esse fato, combinado com a predação humana e a destruição de habitats, coloca desafios significativos para a conservação dessas espécies.

Noções de Qualidade da Água para a Criação de Rãs

A qualidade da água é um fator crucial para o sucesso da ranicultura. Anfíbios, como a rã-touro americana, necessitam de água com altos padrões de qualidade.

pH (Potencial Hidrogeniônico): O pH indica a acidez ou alcalinidade da água, variando de 0 a 14, com 7 sendo neutro. A criação de rãs requer um pH ligeiramente ácido a neutro, entre 6.5 e 7.5. Valores fora dessa faixa podem causar estresse fisiológico e reduzir a eficiência alimentar.

Condutividade Elétrica: A condutividade elétrica mede a capacidade da água de conduzir corrente elétrica, que depende da concentração de íons dissolvidos, como sais. É um indicador indireto da presença de nutrientes e resíduos na água. Valores elevados podem indicar poluição ou excesso de nutrientes.

Alcalinidade Total: A alcalinidade total refere-se à capacidade da água de neutralizar ácidos, sendo influenciada pela presença de carbonatos e bicarbonatos. Este parâmetro é importante para a estabilidade do pH, prevenindo flutuações bruscas que podem afetar a saúde das rãs.

Dureza Total: A dureza total é a concentração de íons metálicos, principalmente cálcio (Ca2+) e magnésio (Mg2+), na água. Estes íons são essenciais para processos fisiológicos e estruturais nas rãs. A dureza também influencia a toxicidade de outros compostos químicos presentes na água.

Amônia, Nitrito e Nitrato: Estes compostos nitrogenados são subprodutos da excreção dos animais e da decomposição de matéria orgânica. A amônia (NH3) é altamente tóxica em concentrações elevadas, enquanto o nitrito (NO2-) e o nitrato (NO3-) são menos tóxicos, mas ainda podem causar problemas em altas concentrações.

Oxigênio Dissolvido (OD): O oxigênio dissolvido é vital para a respiração aeróbica das rãs. Níveis de OD devem ser mantidos acima de 5 mg/L para garantir a sobrevivência e crescimento adequados. Aeração constante e renovação da água ajudam a manter níveis adequados de oxigênio.

Manter a qualidade da água envolve renovação constante e limpeza dos tanques para remover excretas e restos de alimentos. Monitorar regularmente os parâmetros de qualidade da água é essencial para ajustar as práticas de manejo e prevenir doenças.

Referências:

Cribb, A.Y., Afonso, A.M., & Mostério, C.M.F. (2013). Manual técnico de ranicultura. Embrapa.

https://zootecniabrasil.com/2020/08/05/ranicultura/

https://meusanimais.com.br/ra-touro-americana-uma-especie-invasora/

https://www.cpt.com.br/artigos/ranicultura-ganha-cada-vez-mais-espaco-no-brasil

https://revistafae.fae.edu/revistafae/article/download/263/181

Como Citar:

Portal AMBIENTE EM FOCO. ALVES, E. M.; PEREIRA, G. K.; SILVA, M. J.; & ROCHA, D. C. C.  Ranicultura no Brasil: Desenvolvimento Histórico, Biologia e Qualidade da Água da Rã-touro Americana. Projetos: Aprendendo com as Plantas e Animais na Min Fazenda/ Eco Cidadão do Planeta. Série: Desmistificando a Zootecnia/ Comportamento e Bem Estar Animal. Ponto de Vista/Artigo técnico nº3. publicado em 2024. Disponível em: https://ambienteemfoco.com/ranicultura-no-brasil-desenvolvimento-historico-biologia-e-qualidade-da-agua-da-ra-touro-americana . Acesso em DIA/ MÊS/ ANO.

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